Muitas pessoas têm dúvidas sobre como realizar auditorias internas. Porém, essa ferramenta de gestão é extremamente importante para encontrar pontos de melhoria. É por meio das auditorias que comparamos os padrões que estipulamos e o que está acontecendo no dia a dia.
É nesse momento que vamos entender se as coisas estão saindo conforme planejamos. Por isso, mesmo com dúvidas, muitos profissionais se esforçam para auditar suas empresas.
O artigo de hoje surgiu para ajudar profissionais que estão começando no mundo das auditorias. Caso você já tenha certa experiência, vale a pena comparar com as práticas descritas aqui. (Aliás, se você faz algo diferente, deixe nos comentários para ajudar quem está começando)
Esse assunto já estava no nosso calendário editorial, mas a pergunta de uma leitora adiantou (bastante) a execução de conteúdo! Vejamos a dúvida:
Objetivos das auditorias internas
Antes de pensar em como realizar auditorias internas, precisamos falar um pouco sobre os objetivos de auditar. Não é segredo para ninguém que as pessoas têm medo das auditorias. Só de falar em auditor a empresa toda treme. Entretanto, isso é resultado de um erro de conceito, uma falha na comunicação das auditorias.
Por muito tempo, a gestão se preocupava mais em “encontrar culpados” do que, efetivamente, em resolver problemas. Do mesmo modo, grande parte dos auditores focavam muito mais em encontrar erros do que em apontar melhorias efetivas. Dessa época, ainda há resquícios de auditores que não auditam, cobram documentos específicos que eles acreditam ser o SGQ.
Entretanto, antes de se aventurar em como realizar auditorias internas, é preciso entender que:
- 1º – Auditorias são realizadas para encontrar conformidade, para atestar que o sistema segue os padrões de qualidade a que se destina;
- 2º – Nenhuma auditoria visa encontrar culpados! As auditorias NÃO devem ter foco nos indivíduos, e sim nos processos! Os processos é que podem conter falhas.
Tendo em mente esses dois parâmetros, as auditorias têm muito mais chance de obter sucesso. E, para nós, obter sucesso em uma auditoria é encontrar oportunidades reais de melhoria. Dessa forma, compreendemos que a auditoria serve para entender como a empresa atende aos padrões de Qualidade com que se compromete e encontrar formas de melhorá-los.
Entretanto, se os reais objetivos da auditoria forem ignorados, a chance de falha é enorme. Isso irá transformar um importante momento de reflexão e busca por excelência em uma verdadeira caça às bruxas.
1ª etapa: antes de tudo, comunique às pessoas
Dito isso, chegamos à primeira grande ação, que é literalmente explicar os objetivos da auditoria interna para as pessoas.
Como eu disse antes, as pessoas têm medo de serem auditadas. Muitas delas escondem ou omitem informações importantes na hora da audição por medo. Elas acham que podem ser mandadas embora. Acreditam que vão ser penalizadas ou criticadas se receberem NC. Ou então ficam tão nervosas que não conseguem contribuir com a auditoria. É comum que isso aconteça.
Então, o primeiro grande passo é comunicar a auditoria. Mostrar os reais objetivos desse processo e ajudando as pessoas a ficar mais confortáveis. Somente assim sua auditoria vai conseguir ser realmente efetiva. Além de se tornar mais ética, responsável e humana! (Tudo que a Fábrica realmente acredita 😁)
Como realizar auditorias internas (“tutorial“)
As auditorias internas requerem muito planejamento e estudo, mas é comum travar no começo. Afinal, são muitas pequenas ações e uma responsabilidade muito grande! Assim, precisamos dividir esse projeto em partes menores, que vamos chamar de etapas.
Neste artigo, vamos ver um passo a passo de como fazer isso. Você pode segui-lo em ordem, mas também pode (e deve) fazer adaptações de acordo com o seu contexto. Vamos à próxima etapa!
2ª etapa: definir o padrão que será auditado
Pense na dúvida da leitora, ela vai direto para as ações: que perguntas fazer, como montar checklist, como solicitar planos. Entretanto, antes disso, precisamos entender o que será auditado.
A auditoria é a comparação de um padrão (critério, norma, diretriz, processo, etc) com a execução de algo. Assim, sem entender muito bem qual será o padrão auditado, não é possível prosseguir com a auditoria.
E essa definição pode ocorrer de várias formas. Pode ser uma demanda da diretoria. Uma norma de engajamento que está em implantação. Até mesmo os procedimentos do próprio processo. A questão é: Qual padrão irá comparar ao processo que está em andamento?
3ª etapa: definir a equipe de auditoria
Em alguns contextos, é possível auditar sozinho. Empresas menores, com pouco colaboradores e processos, por exemplo. Entretanto, em empresas com muitos colaboradores ou muitos processos envolvidos, é preciso montar uma equipe.
Obviamente, não há uma regra quanto a quantidade mínima ou máxima de pessoas. Porém, é preciso entender que a quantidade de auditores está diretamente ligada ao tempo de auditoria. Menos auditores vão levar mais tempo para auditar tudo.
Etapa 3.2
Compre camisetas do Senhor das Evidências e da Auditora Maravilha e distribua para a equipe de auditoria! =D
Pode parecer brincadeira, mas estou falando sério, haha! Ao escolher o time, você pode fazer algo especial, criando uma ação de engajamento e conscientizando sobre a auditoria interna.
Você pode entregar as camisetas em um momento com toda a empresa. Isso vai mostrar para as pessoas que a auditoria é um momento importante. Que elas podem contar com os auditores que, como qualquer super-herói, surgem para ajudar. Os vilões não são os auditores, mas sim o retrabalho, o desperdício, os problemas que fazem o cliente reclamar, e por aí vai.
Então, faça um evento especial para a equipe de auditores internos, vai valer muito a pena! Mesmo que você não compre nossas camisetas! (mas não esquece que temos condições especiais para compras empresariais, 🤓 hehe)
Treinamento dos auditores
Além disso, é muito importante entender que TODOS os auditores precisam ser competentes. Isso significa que eles têm de receber treinamento para exercer a função e auditar da maneira correta. Assim, é preciso:
- Treinar as pessoas nos padrões que serão auditados (normas, por exemplo);
- Treinar as pessoas sobre como realizar auditorias (internas ou não).
Uma pergunta comum é se os auditores precisam receber treinamento formal sobre normas e auditorias. Se elas precisam, por exemplo, fazer um curso de auditor líder. A questão aqui é que as pessoas precisam adquirir competência. Então elas precisarão participar de algum tipo de treinamento.
Entenda que se você estiver auditando como parte de um programa de certificação de uma norma, as exigências serão maiores. Nesse caso, é possível treinar as pessoas internamente? Sim, é possível. No entanto, você vai precisar documentar esse treinamento e encontrar formas de atestar sua eficácia.
Contratar um treinamento externo (in loco ou não) é mais prático, pois você conta com uma empresa especializada nisso. O próprio certificado valerá como “atestado de competência”.
Se for organizar o treinamento internamente, é preciso criar cronogramas, conteúdo programático, material, além criar formas de atestar que a competência foi adquirida (“provas”). Mas é possível.
4ª etapa: criar checklist de auditoria
O checklist é uma ferramenta importante para a boa execução da auditoria. Por meio dele é possível se organizar e cobrir todos os pontos importantes do padrão auditado. E agora que você já tem a equipe e sabe qual padrão irá auditar, pode-se criar o checklist.
Antes, sugiro que você divida o trabalho com a equipe. O mais comum é dividir por processos, indicando qual processo fica a cargo de qual auditor da equipe. Isso vai ajudar as pessoas a linkar o padrão auditado ao processo que ela vai analisar.
Em seguida, você começa a criar as perguntas de acordo com o padrão auditado. Você pode formalizá-las em um software, um documento do Word, planilha do Excel ou até mesmo em papel. (papel é um pouco antiquado, mas também tem um certo charme, não é? – Masss dá mais trabalho depois, então prefiro meios digitais! hehe)
Como criar perguntas para o checklist de auditoria
Muitas pessoas se perdem aqui, pois começam a pensar no processo e em como fazer perguntas para ele. Mas calma, aqui, o trabalho é adaptar o padrão a perguntas que te ajudem compará-lo com o processo. Assim, você deve partir do padrão para fazer as perguntas, e não do processo.
Pode parecer um bicho de 7 cabeças, mas não é. Você precisa entender o padrão e criar perguntas a partir dele.
Exemplos de perguntas:
Vamos pegar um item da 9001:2015 (esse seria o nosso padrão). No item 4.1, a norma diz que a empresa “deve determinar questões internas e externas que sejam pertinentes para o seu propósito”.
Para auditar esse item do padrão, precisamos perguntar para os responsáveis por essa definição, nesse caso a Alta Direção, como isso foi feito. As perguntas podem ser algo como:
- Quais fatores internos impactam a empresa?
- Quais fatores externos impactam os processos da empresa?
- Como vocês determinaram quais fatores externos ou internos afetam a Qualidade na empresa?
- Que ferramentas foram utilizadas para determinar o contexto da empresa?
Porém, entenda, essas perguntas são apenas referenciais. São algo que vai dar início a conversa e possibilitar uma análise mais aprofundada. Elas, por si só, não vão te mostrar se o item está conforme ou não.
Outro exemplo: no item 4.2, a norma estipula que a empresa deve “determinar as necessidades e expectativas das partes interessadas”. (os famosos stakeholders!) Então, podemos fazer perguntas como:
- Quais são as partes interessadas do seu negócio (ou processo)?
- Como vocês definiram as necessidades e expectativas das partes interessadas?
- Quais ferramentas vocês usaram para definir as expectativas das partes interessadas?
- Quais ferramentas vocês usaram para identificar as partes interessadas?
No caso da 9001, por exemplo, você precisa fazer perguntas para TODOS os itens, então é só seguir a norma e criar seu checklist item a item. De qualquer forma, é importante que você tenha perguntas que cubram TODO o padrão auditado, seja ele qual for.
Perguntas como essas vão te ajudar a se manter no item e a entender o que a empresa faz. Analisando as respostas e conversando com os auditados, você terá mais subsídios para entender com a empresa atende o item, quais são as boas práticas e se há algo não conforme.
5ª etapa: cronograma, auditoria e formalização
Depois que você e sua equipe criarem um bom checklist, estarão prontos para auditar. Então será preciso montar um cronograma, colocando as datas, os processos e os responsáveis pela auditoria. Também é interessante informar esse cronograma para o restante da empresa.
Depois, e só partir para a auditoria em si, seguindo o cronograma e escolhendo os colaboradores a serem auditados. Basicamente, você irá seguir o checklist, comparando o padrão auditado ao que as pessoas executam no dia a dia. As não conformidades ocorrem quando o que é feito no dia a dia não está de acordo com o padrão auditado.
Cabe ressaltar que é preciso documentar a auditoria. Muitos auditores optam por documentar apenas as não conformidades, mas é interessante registrar as boas práticas e o que pode ser replicado em outros setores. Lembre-se, a auditoria serve para melhorar os resultados da empresa!
6ª etapa: apresentação de resultados da auditoria
A pergunta da nossa leitora ainda fala sobre apresentação de resultados e solicitação de planos de ação.
A apresentação de resultados, em tese, não tem muito segredo. Você terá auditado todos os itens e documentado tudo que está conforme ou não conforme. Agora, é só montar um relatório ou PowerPoint (famoso PPT) com esses resultados.
Não há uma estrutura fixa, mas você pode apresentar:
- Quantidade de itens conformes;
- Quantidades de itens NÃO conformes;
- Principais boas práticas da empresa;
- Boas práticas que podem ser replicados em outros setores;
- Principais não conformidades encontradas;
- Agrupamento de Não conformidades por Setor ou Área;
- Não conformidades que chegaram ao cliente,
- E por aí vai.
Você pode, e deve adequar a apresentação de resultados ao contexto da sua empresa, às necessidades dela. Além disso, sugiro uma reunião para a apresentação desses resultados. Não adianta só enviar o PTT para as pessoas. Você pode até mesmo criar uma gestão à vista.
Nessa reunião, escolha pessoas chave. Aquelas que vão dar continuidade ao trabalho, tratando as não conformidades ou implantando boas práticas em seus setores. Assim, a diretoria tem grande interesse nos resultados da auditoria, porém também pode ser interessante chamar lideranças ou até mesmo colaboradores da execução.
“7ª etapa”: planos de ação
Na pergunta da nossa leitora, consta “como […] solicitar planos de ação”, mas não considero essa etapa parte da auditoria. Por isso as aspas do título.
Entretanto, entendo que montar planos de ação é a continuação natural da auditoria. Afinal, a auditoria é apenas observatória, indicativa, ou seja, ela apenas analisa e aponta o que precisa ser mudado.
Saber como realizar auditorias internas, e realizá-las, mas não criar planos de ação é o mesmo que ir ao médico, mas não tomar os medicamentos. Então é preciso criar plano pós-auditoria!
Dessa forma, você pode aproveitar a própria apresentação de resultados, distribuindo as ações de acordo com os responsáveis. Entretanto, você precisará garantir que as pessoas entendam a conexão entre as NCs (ou boas práticas) e o trabalho delas.
Acredito que somente após a distribuição das ações é possível definir prazos e monitorar o andamento. Mesmo porque algumas ações podem ser muito simples, enquanto outras talvez precisem de um projeto elaborado. Além disso, muitos dos responsáveis podem precisar da sua ajudar para identificar causas e criar planos de ação, isso é muito normal.
De qualquer forma, o caminho pós-auditoria é:
- Distribuir as Não conformidades;
- Distribuir as Oportunidades de melhoria e Boas práticas;
- Criar planos de ações;
- Monitorar os planos de ação;
- Voltar a auditar depois de certo período.
Agora, você já sabe como realizar auditorias internas!
Eu sei que fazer auditorias é desafiador. Eu auditei internamente e tive várias inseguranças e medos. Numa auditoria, por exemplo, eu tive de auditar o pessoal da Qualidade. As meninas tinham um conhecimento absurdo sobre Gestão e Qualidade e eu senti uma pressão enorme.
Foi difícil, as primeiras perguntas foram meio tortas, pareciam um pouco desconexas. Tanto eu quanto as auditadas estávamos nervosos. Mas as coisas fluíram e conseguimos encontrar pontos de melhoria e boas práticas. Também surgiram algumas NCs. (Sim, eu dei não conformidade para o pessoal da Qualidade, haha!)
Entretanto, ninguém morreu e eu estou aqui escrevendo esse texto para você. O que eu quero dizer é: claro que minha primeira auditoria não foi linda e perfeita, mas cumpriu seu papel. E venho melhorando desde então.
Além disso, nós provavelmente nunca teremos todas as respostas sobre como realizar auditorias internas. (ou sobre qualquer outra coisa) Então, você NÃO precisa se pressionar para fazer a auditoria mega-ultra-power! Apenas para fazer uma auditoria verdadeira, que busque realmente melhorar os processos, a empresa e a vida das pessoas.