Já se passaram 5 anos desde a última atualização da ISO 9001 (Requisitos para Sistemas de Gestão da Qualidade). A atualização de 2015 foi disruptiva, pois modernizou conceitos e deixou claro alguns tópicos que foram sofrendo interpretações erradas durante sua aplicação.
O sistema de gestão que antes era jogado nas costas do RD (Representante da Direção) foi devidamente colocado sob responsabilidade da alta direção. As informações documentadas “deixaram” de ser apenas documentos de texto físicos ou digitais (uma coisa que, na verdade, nunca foram).
Posso dizer que a mudança foi drástica, afinal muitos profissionais da qualidade, diretores, auditores e consultores sofreram um pouco para entender essa atualização, e outros até foram resistentes às mudanças. Teve muita empresa reprovando na auditoria por não ter se adequado.
Mas, na minha opinião, a ISO ainda deixou a desejar em uma coisa: faltou mudar o conceito de que tudo que essa norma representa NÃO é Gestão da Qualidade!
A Gestão da Qualidade
Segundo a ISO 9000:2015, a qualidade é determinada pela capacidade de satisfazer os clientes e pelo impacto pretendido e não pretendido nas partes interessadas pertinentes, e inclui também o valor percebido e benefícios dos produtos e serviços que a empresa entrega para o cliente.
Dessa forma, um sistema de gestão da qualidade:
- compreende atividades pelas quais a organização identifica seus objetivos e determina os processos e recursos necessários para alcançar os resultados desejados;
- gerencia a interação de processos e recursos necessários para agregar valor e realizar resultados para as partes interessadas pertinentes;
- permite à Alta Direção otimizar a utilização dos recursos considerando as consequências de suas decisões a curto e longo prazo;
- Provê meios para identificar ações para tratar consequências pretendidas e não pretendidas na provisão de produtos e serviços.
Ou seja: a Qualidade, ou um Sistema de Gestão da Qualidade, cuida de como a empresa se organiza para entregar valor às suas partes interessadas de forma sustentável.
Mas isso para mim parece básico. Afinal, uma empresa não nasce para fornecer produtos e serviços que agreguem para o cliente e gerem resultados para todas as partes interessadas?
A gestão de uma empresa
Peter Drucker, conhecido como pai da administração moderna e um dos maiores especialistas em gestão de negócios, defendia que o cliente é a prioridade de uma empresa, e não o produto e serviço. Logo, produtos e serviços devem ser feitos para agregar valor para o cliente ao invés de fazer com que os clientes se adequem a produtos e serviços.
A administração, para ele, era “planejar, organizar, ajustar, medir e formar pessoas” Ele defendia que a empresa era um conjunto de áreas que se agregam para analisar a empresa como um todo.
Outro carinha bem conhecido da Administração é Henry Mintzberg, pensador que defende a gestão estratégica.
Com sua teoria dos 5Ps da estratégia, Mintzberg defende que a estratégia da empresa pode e deveria ser tratada como:
- plano: onde deve ser definida uma diretriz ou conjunto de diretrizes para serem seguidas na empresa;
- pretexto: para que aumente a autoridade e força da empresa frente a concorrência;
- padrão: onde a empresa consolida uma forma de atuação, desde processos até comportamentos dos colaboradores, que traz confiabilidade frente ao mercado;
- posição: em que a empresa encontra um ou mais diferenciais para se destacar no mercado;
- perspectiva: em que se considera as pessoas envolvidas com a empresa para tomar decisões.
Usados de forma combinada, Mintzberg creditava aos 5Ps da estratégia a chave do sucesso de uma empresa.
Sistema de gestão da qualidade e administração de empresas são a mesma coisa! (Pronto, falei! 🤯)
Mas porque estou colocando todas essas definições? Pois, para mim, estratégia, administração, gestão ou qualidade buscam a mesma coisa: como uma empresa precisa atuar para ter sucesso.
Uma empresa deve estar atenta ao seu contexto e às pessoas, com foco centrado no cliente. Com padrões que trazem confiabilidade ao mesmo tempo em que trazem diferenciais para seus produtos e serviços e para gerar valor a todas as partes interessadas.
Para que dê certo, ela precisa planejar sua atuação, organizar suas atividades, ajustar-se frente aos aprendizados, medir os resultados e desenvolver as pessoas. E tudo isso são conceitos intrínsecos da Gestão-Qualidade-Estratégia-Administração.
Podemos confirmar isso quando:
- Mintzberg traz estratégia como um plano, e a ISO 9001 coloca a política da qualidade como direcionador do sistema de gestão;
- Drucker diz que precisamos medir resultados e o requisito 9 da ISO 9001 diz para fazermos avaliação do desempenho da empresa;
- Mintzberg lida com estratégia como forma de pretexto e posição, e a ISO 9001 pede para analisarmos o contexto em que a empresa está inserida;
- Drucker traz a importância do ajuste dos resultados insatisfatórios e a ISO 9001 trata não conformidades.
Conceitos trazidos por Gurus da Qualidade, como o ciclo PDCA de Deming foram aprendizados percebidos nas experiências de administrações de empresas.
Conceitos trazidos por pensadores da administração moderna, como o cliente sendo prioridade de uma empresa de Drucker, foram aprendizados percebidos nas experiências de sistemas de gestão da qualidade.
Agora me diz, você ainda tem dúvidas de que “Na natureza No dia a dia das empresas, nada se perde e nada se cria, tudo se transforma”?
Mas, Marina, todas as normas ISO têm a mesma estrutura (anexo SL) que a 9001
Sim, de fato! Todas deveriam, portanto, ser normas de administração de empresas? Sim e não.
O anexo SL é o queridinho das empresas que possuem Sistema de Gestão Integrado (SGI). Entretanto, outras normas trazem todos esses requisitos focados em determinadas perspectivas, como meio ambiente, segurança de alimentos, saúde e segurança de colaboradores, inovação, compliance, segurança de informações, riscos, etc.
Essas normas trazem versões aprofundadas de assuntos que são colocados superficialmente na ISO 9001, mas que precisam ser geridos pelas empresas (ou precisam ser administrados, se você preferir).
Seria justo, portanto, limitar a norma ISO 9001 a um conceito “apenas” de qualidade?
Segundo a International Organization for Standardization (ISO), as normas devem ser revisadas a cada 5 anos, no máximo, para que seja feita uma análise crítica da pertinência e adequação do que está escrito nelas (se não for revisada em 5 anos, quem dá não conformidade para eles? 🤣).
Bem, de acordo com isso, em setembro de 2020 venceu o prazo da versão 2015 e ela precisa ser revisada novamente. Então, para terminar meu texto de hoje, deixo para você algumas perguntas!
Será que dessa vez teremos um novo pensamento disruptivo ou ficaremos com uma atualização “básica” como tivemos da versão 2005 para a versão de 2008? Será que dessa vez, a norma deixará de nominar sistemas de gestão como sistemas de Gestão da Qualidade e ganhará mais requisitos que abram espaço para a implantação de mais normas para o sucesso da GESTÃO de uma empresa?
