Eu sei que fatos e dados são uma máxima da gestão, que eles imperam na tomada de decisão. São uma máxima ainda mais consolidada na nossa área. Temos um princípio da Qualidade expresso na ISO 9001, para nos ajudar a lembrar disso. “Tomada de decisão baseada em evidência”.
Entretanto, por experiência, posso dizer que eu mesmo já tomei várias decisões baseadas em evidências e errei. Decisões aparentemente pautadas nas melhores informações e juramentadas nos fatos e dados. Mesmo assim, já cometi vários erros na minha vida e carreira.
Por isso, no artigo de hoje, gostaria de falar com você sobre esse aspecto. Discutir um pouco o processo de decisão e esse nosso dogma: os fatos e dados. Apesar do que pode parecer, esse texto é mais um alerta do que uma restrição. Então, fica comigo até o final para entender essa história.
Apenas basear-se em fatos e dados na gestão não vai garantir que você acerte
O que estou propondo é que a tomada de decisão baseada em fatos e dados pode falhar. Ou seja, podemos tomar a decisão errada mesmo “baseados” em evidências. Entretanto, como veremos, a culpa não é necessariamente das evidências. Pois há alguns fatores que podem induzir ao erro.
1) Nos baseamos em Fatos e Dados incompletos
Muitas vezes (ou quase sempre), mesmo que fizermos um trabalho exaustivo para reunir as informações necessárias, ainda assim não teremos TODAS as informações disponíveis. E eu digo TODAS as disponíveis, não todas as necessárias.
A quantidade de informações que circula, atualmente, em nossas vidas é absurda. Segundo um estudo da Universidade de Berkeley (How Much Information), nós:
- Consumimos conteúdo por 11,8 horas ao dia;
- Recebemos cerca de 33,8 gigabytes de informações nesse período;
- Lemos ou ouvimos em média 100 564 palavras (o equivalente a uma bíblia por semana).
Um detalhe importante: esse estudo é de 2009…
Ainda assim, mesmo recebendo o que os pesquisadores chamam de “avalanche de dados”, nós não recebemos TODAS as informações disponíveis sobre as coisas. É impossível saber tudo de tudo.
2) Nosso cérebro muitas vezes ignora os fatos e dados
Um outro estudo interessante mostra que nosso cérebro toma as decisões antes mesmo de nós estarmos cientes delas. O estudo, conduzido pela Universidade de New South Wales, na Austrália, mostrou que era possível prever resultados 11 segundo antes de as pessoas determinarem suas decisões.
Muitas vezes, por maior que seja o esforço, nosso cérebro ignora os Fatos e Dados a nossa frente e simplesmente escolhe o que quer. Ele tem mecanismos próprios para racionalizar aquela decisão, por pior que ela seja. Ele vai encontrar formas de tornar aquela decisão acertada, mesmo que todos os Fatos e Dados mostrem o contrário.
Uma prova disso é o Pentágono da Fraude, sobre o qual já falei aqui no portal. Um dos cantos do pentágono fala exatamente disso. Corrupção é errado, certo? Algo abominável. Entretanto, as pessoas que comentem atos fraudulentos passam por uma etapa em que o cérebro delas racionaliza esses atoa e, de alguma forma, os justifica.
3) Existe a intuição nos negócios
Esse terceiro é o mais polêmico, e o mais escrachado no meio. No mundo empresarial, é quase um crime falar que “Vamos seguir nossa intuição”. (Mesmo que algumas pessoas ainda achem isso um pouco charmoso)
Entretanto, um estudo (vamos a outro estudo, haha) publicado na revista científica Psychological Science propõe que a intuição, na verdade, é a resposta rápida do cérebro a um determinado conjunto de informações. O cérebro processa tudo que está envolvido na situação e deduz que algo não está aparente, que alguma coisa está além do que podemos enxergar em determinado momento.
Por exemplo, imagine que você está em uma auto estrada. Você está dirigindo e tendo uma conversa agradável com a pessoa ao seu lado. (Imagine alguém que você gosta muito ao seu lado 😊). Então, podemos dizer que há certo nível de distração.
De repente você vira o volante um tanto rápido e desvia de um buraco que você não tinha visto. Você se assusta, era um buraco que poderia estourar um pneu e causar um acidente grave. Você não sabe como fez aquilo, você não havia visto o buraco e, mesmo assim, desviou. Talvez tenha sido intuição?
Segundo os pesquisadores, essa ação foi resultado de um conjunto de informações que seu cérebro recebeu. Mesmo sem você perceber.
Por exemplo: os carros a sua frente reduziram a um pouco velocidade. Vários carros, tempo antes, mudaram de faixa. Alguns carros desviaram do buraco pouco a frente dele. Então, seu cérebro, antes de você, compreendeu um padrão: todos os carros estão saindo da rota X, e resolveu fazer a mesma coisa. Muitas vezes, você não se assusta nem nada, pois desviou do buraco muito antes. Pode ser que nem o tenha percebido.
Mas e agora, José? Festa da tomada de decisão baseada em qualquer coisa que seja! Uhull! 🎉🥳🎆
Opa opa opa! Calma lá, calma lá, calma lá! É agora que o texto começa a voltar para os trilhos, haha!
Esse texto NÃO é a abolição da tomada de decisão baseada em fatos e dados! De jeito NENHUM! Pelo contrário, deixar de analisar fatos e dados antes de tomar decisões é um erro. Dos grandes.
Entretanto, esse texto alerta para o fato de que, nem sempre, as decisões que tomamos realmente são as corretas, pois:
- Nos faltam dados para entender a situação;
- Nossos desejos podem fazer nosso cérebro se enganar;
- Ignoramos nossa intuição por ela ser “uma crendice”.
Alem disso, há um outro erro possível: nós interpretarmos os Fatos e Dados de forma equivocada, nós errarmos na análise. Mas escolhi não falar desse assunto no artigo de hoje pois considerei esse uma vertente um pouco diferente. (Esperem próximos capítulos neste mesmo canal, haha)
“Mas então, o que fazemos Davidson para acertar na Tomada de Decisão?”
Olha, não há caminhos fáceis na gestão. Pelo contrário, tudo pode ser incrivelmente empolgante e tortuoso! (tenho sentido isso na pele desde que criamos a Fábrica, hehe) Porém, acho que o ponto principal é entendermos o processo decisório e, assim, fazê-lo de forma consciente.
O problema de não conhecer os perigos desse caminho é que podemos acreditar que nossa interpretação é a verdade universal. O que pode estar errado. Assim, para que nós realmente tomemos uma decisão baseada em fatos e dados, precisamos nos esforçar para tomar alguns cuidados:
1) Coletar todos os dados possíveis. Sabendo que não é possível coletar TODOS, precisamos ter dados suficientes, que nos deem segurança de que compreendemos bem a situação;
2) Conseguir compreender até que ponto essa decisão vai ao encontro dos (ou de encontro aos) nossos interesses e, assim, ponderar nossos desejos na hora de bater o martelo;
3) O ponto fundamental (onde geralmente erramos): não ignorar as intuições de ninguém. Tratando-as como um ponto cego, como um fator que não foi coberto pelos Fatos e Dados disponíveis. Dessa forma, se há uma intuição envolvida, precisamos investigá-la.
Se conseguirmos alinhar esses três pontos em nosso processo de Tomada de Decisão, então estaremos verdadeiramente tomando decisões baseadas em fatos e dados. Do contrário, corremos o risco de estar apenas analisando superficialmente as coisas, cedendo aos nossos egos inflados. Ou pior, podemos simplesmente ignorar boas “intuições” das nossas equipes por preferir ceder à Doce Ilusão dos Fatos e Dados.