Melhoria de processos não tem nada a ver com aperfeiçoamento pessoal

Empresas estão confundindo melhoria de processos com aperfeiçoamento pessoal e isso pode ser extremamente prejudicial para ambas as partes!

Apesar de este texto falar, em síntese e relevância, sobre melhoria de processos, gostaria de deixar claro que ele é um desabafo. E até o final do artigo você verá mais disso, então, compreendo se você quiser parar a leitura por aqui.

Produzo conteúdos há certa de 6 anos. Quem me acompanha sabe que não sou de “ditar regras”, “fórmulas mágicas” ou coisa do tipo. Me considero uma pessoa normal que gosta de escrever artigos sobre Sistemas de Gestão. Assim, já escrevi centenas de artigos, e nem sempre eles saem da minha cabeça “de supetão”.

Muitos deles, fermento na minha cabeça e espero o momento certo para produzir. O artigo de hoje é um deles. Estou dizendo isso porque algo sempre que me incomodou, mas eu não sabia como e o que dizer sobre o assunto.

Agora, acredito que isso está mais claro para mim, então me sinto confortável para falar sobre o assunto. Resumindo, eu acredito que muitas empresas estão confundindo melhoria de processos com aperfeiçoamento pessoal. Hoje, tenho consciência para entender que já passei por isso. Para entender como isso foi prejudicial em todos os sentidos.

Melhoria de processos

É fácil entender o que é melhoria de processos. Trata-se, com o perdão da simplicidade, de melhorar os processos. Torná-los mais rápidos, baratos, confiáveis. É um processo continuo, árduo e que pode transformar a realidade da empresa de formas inimagináveis!

Auto aperfeiçoamento

É o processo a que cada um de nós se submete para sermos pessoas melhores. Ele varia de pessoa para pessoa e, nem sempre, é um ato consciente. Enquanto a melhoria de processos está ligada à empresa e ao processo, o auto aperfeiçoamento está ligado ao eu e somente a ele.

Texto besta, Davidson!

Você pode estar se perguntando: “Que besteira, mas o que tem para confundir em dois assuntos tão claros?”. E não tiro sua razão, realmente são dois contextos muito diferentes. Porém, o que acontece é que muitas empresas atribuem a falha dos processos às pessoas.

Sabe aquela história do “Se você prestasse mais atenção…”?

Por exemplo, imagine que a seladora X da empresa Y esteja com problemas. Ao invés de chamar um técnico e fazer o reparo corretamente, o pessoal amarra um arame no equipamento e pau na máquina! Antes, é claro, fazem a ressalva: “Olha, a máquina está com problemas, você, operador, precisa tomar cuidado”.

Mas é claro que a cota de produção e a exigência não diminuem. Resultado, um pedaço do arame se desprende e vai parar no produto do cliente. Que reclama.

No final das contas, na hora de apurar o ocorrido, chega o veredito: “Mas bem que nós te falamos, operador, que você precisava prestar atenção naquele arame… então, se tivesse prestado mais atenção isso não teria acontecido”.

Causa raiz do problema (apontada pelo pessoal): falta de auto aperfeiçoamento, pois “o operador tem déficit de atenção…”. (cômico se não fosse trágico)

Causa raiz verdadeira: um dos recursos do processo (a seladora) não é adequado a execução, precisa de manutenção ou substituição. Problema de processo!

E se o buraco da melhoria de processos “for mais embaixo”?

Eu sei, o exemplo parece esdrúxulo, pouco profissional e pouco verossímil (mas acontece, haha). Então, vamos sair um pouco da produção fabril e pensar em alguma função administrativa.

“No escritório” nós nem sempre temos clareza sobre os processos, nem sempre os temos mapeados. Afinal, há muitos processos que só acontecem por causa da força da necessidade, nunca foram mapeados. É exatamente neste contexto que nós mais cobramos dos colaboradores:

  • Um erro de digitação em um número importante: “Ao, ó, não presta atenção…”.
  • Um documento que se extravia ou rasura: “Se não estivesse distraído…”.
  • Um processo lento e burocrático que trava o setor e está sempre atrasado: “Você precisa ser mais produtivo, precisa melhorar…”.

Quantas e quantas vezes isso não acontece diariamente nas empresas, mas todo mundo só olha do topo do buraco processo problemático e culpa “o operador”? Quantas vezes a culpa da desorganização e falha dos processos não acaba virando culpa da falta de “auto aperfeiçoamento” do colaborador?

Quem sofre com essa confusão toda?

O que acontece, então, é que o colaborador vive pressionado, se sentindo mal e incompetente. Em contrapartida, a empresa sofre com a falta de resultados e, é claro, continuar empregando esforço no lugar errado.

Além disso, não quero ser o polemizador e dizer que não há diversas outras nuances nessa história, pois definitivamente há! Nem sempre é fácil identificar essas lacunas (tanto de processo como de aperfeiçoamento).

Entretanto, é preciso ter clareza sobre algumas coisas:

  • Melhoria de processos é o que as empresas precisam implementar para serem melhores, mais competitivas, humanas e lucrativas.
  • Auto aperfeiçoamento é o que as pessoas precisam fazer para melhorar a si mesmas. (e que as empresas inteligentes estimulam e incentivam)

Todas as falhas que ocorrem na empresa são, essencialmente, falhas de processos. São não conformidades. Se o colaborador não tem competência para executar a tarefa X, então a falha é do processo de integração e capacitação!

As empresas, ao estimular o auto aperfeiçoamento, pretendem, então, formar pessoas melhores, capazes de promover melhorias nos processos. Por mais “doloroso” que seja pensar dessa forma, podemos dizer que: o colaborador não é obrigado a se auto aperfeiçoar*; mas a empresa é obrigada a melhorar seus processos, buscando um modelo que, por si só, impeça as pessoas de errarem. (sinto que esse parágrafo vai me trazer problemas, hehe)

Agora, para terminar, gostaria de deixar uma frase que era originalmente o título desse artigo, mas eu mudei porque achei muito sensacionalista, haha! (#medo dos haters, sqñ 😂). Para mim: empresas sérias não cobram pessoas, cobram melhoria de processos!

*nota: esse texto não é, de modo algum, uma apologia ao comodismo ou um manifesto contra o auto aperfeiçoamento. Nós acreditamos que tanto os processos quanto as pessoas precisam melhor para transcender a algo superior (quem sabe para super-heróis 😁). Entretanto, acreditamos que são coisas diferentes e, assim, precisam ser tratadas de forma diferente. Se você, em algum momento, entendeu que nós estamos incentivando a estagnação, por favor releia o texto.

Dave Ramos
Dave Ramos

Sempre acreditei que as pessoas tem o poder de mudar o mundo a sua volta, desde que estejam verdadeiramente engajadas nisso. Tive ainda mais certeza disso quando me tornei Auditor Líder ISO 9001:2015 e comecei minha jornada na Qualidade. Por isso continuo a escrever sobre gestão e por isso criei a Fábrica de Qualidade: para ajudar pessoas a engajar pessoas! Clique AQUI para visitar a Fábrica.

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